Estréia hoje, sexta feira 13, em todo território nacional (e espero que daqui a pouco no internecional também!).
Segundo Cora:
Nas montanhas da Lua
Casa de areia
Os Lençóis Maranhenses estão, com certeza, entre os lugares mais bonitos do mundo -- sobretudo vistos do alto, do relativo conforto de um teco-teco, como eu os vi, há tantos anos. Em terra firme, se é que se pode chamar areia de terra, e o que se move continuamente de firme, estão, com igual certeza, entre os mais inóspitos.
É a este cenário improvável que chega, nos idos de 1910, a caravana formada por um aventureiro (Ruy Guerra), sua mulher, a sogra, alguns animais e meia dúzia de empregados. Nos trajes das mulheres, em objetos anacrônicos e num álbum de fotografias há vestígios do mundo urbano e elegante que ficou para trás; mas logo os empregados fogem, o aventureiro morre e as duas mulheres, vítimas da ilusão alheia, acabam sozinhas no deserto, de onde não conseguirão escapar.
As mulheres são, claro, as duas gloriosas Fernandas, cada qual melhor do que a outra na dificílima arte de contracenar com a areia e o silêncio. Áurea (Torres) e a mãe (Montenegro) sobrevivem graças a Massu (Seu Jorge e, mais tarde, Luiz Melodia), descendente de escravos. A vida se reduz ao essencial, enquanto a casa construída pelos membros da antiga caravana vai sendo invadida pela areia.
Às vezes há notícias do mundo, mas elas pouco ou nada significam: através de Luiz (Enrique Diaz e, depois, Stênio Garcia), Áurea toma conhecimento de que a guerra, que ela nem sabia que começara, acabou. O jovem tenente também faz com que ela volte a tomar conhecimento de sentimentos adormecidos, e promete levá-la consigo de volta à civilização. Áurea, no entanto, está irremediavelmente condenada ao deserto.
O tempo passa. Áurea é agora a outra Fernanda, a Montenegro. Como sua mãe antes dela, está conformada com o destino. É como se a areia, que vai tomando a casa, tomasse também o coração das pessoas: 90% de areia nas praias, 80% de areia nas almas... Apenas sua filha Maria (Fernanda Torres e, em criança, Camilla Facundes) conseguirá quebrar o encanto e fugir do areal; sua volta às dunas, anos depois (como Montenegro filha de Montenegro, genial!), é um momento de pura emoção.
Misterioso, contido e lindamente fotografado, "Casa de areia", heróico sob todos os aspectos, seria um grande filme com qualquer bom elenco. Com o jogo fenomenal das Fernandas, porém, ele ganha uma carga dramática de alta intensidade, uma dimensão metafísica única, e transforma-se num filme extraordinário.
(O Globo, Rio Show, 13.5.2005)
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